Demi
Se ao menos eu pudesse usar luvas o tempo todo, me sentiria
mais segura, mas o maldito código de vestimenta da escola não me permitia.
Por isso, meu armário era composto de qualquer coisa com
mangas longas quanto mais longas, melhor.
Agarrei a ponta das mangas e puxei sobre os dedos, fazendo
a blusa de algodão azul ficar pendurada no ombro direito. No meu primeiro ano, eu
teria surtado se as pessoas encarassem minha pele branca e as sardas laranjas.
Agora, eu preferia que as pessoas olhassem para o meu ombro nu em vez de
perceberem as cicatrizes nos meus braços.
- Ela te disse quem é? Aposto que é o Jackson Coleman. Ouvi
dizer que ele vai mal em matemática e, se não melhorar as notas, vai perder a bolsa
na faculdade. Meu Deus, espero que seja. Ele é tão gato. – Minha melhor amiga,
Lila McCormick, respirou pela primeira vez desde que eu tinha dado a ela um
resumo da minha sessão de terapia e do emprego de monitoria que a Sra. Collins
criou espontaneamente. Com a boca que se mexia sem parar e as roupas apertadas,
Lila era a versão da Eastwick High da Glinda, a Bruxa Boa. Ela flutuava na sua
própria bolha maravilhosa, espalhando alegria e felicidade.
Conforme Lila arrastava a bandeja pela fila do almoço, o
cheiro de pizza e batata frita fez minha boca se encher de água, mas o enjoo no
meu estômago me impediu de comprar comida. Meu coração trovejava, e abracei o
caderno de desenho com mais força. Eu não acreditava que estava mesmo no
refeitório. Lila e eu éramos melhores amigas desde a pré- escola, e a única
coisa que ela me pediu de Natal foi que eu largasse a biblioteca e voltasse ao
meu velho lugar na nossa mesa de almoço.
Pode ter parecido um pedido simples, mas não era. A última
vez que almocei no refeitório foi no começo de maio, no segundo ano: um dia antes
de meu mundo todo se despedaçar. Naquela época, ninguém me encarava nem
sussurrava.
- Quem é gato? - Natalie furou a fila, colocando sua
bandeja entre mim e Lila. Um grupo de caras atrás de nós rosnou contra a ousadia.
Como sempre, ela ignorou. Natalie era a segunda das duas pessoas que se
recusavam a me tratar como uma paria escolar por causa das fofocas que corriam
sobre mim na escola.
Lila fez um rabo de cavalo com o cabelo dourado liso antes
de pagar ao caixa.
- Jackson Coleman. A Demi vai ser monitora de um cara
sortudo e estou achando que pode ser ele. Quem você gostaria de adicionar à
nossa lista de caras gatos mas burros?
Segui as duas até a mesa do almoço enquanto os olhos da
Natalie vasculhavam o refeitório, buscando a combinação certa.
- Nicholas Green. Ele é mais burro que uma porta, mas daria
uma boa sobremesa. Se você for monitora dele, Demi, acha que pode me apresentar?
- Apresentar quem pra quem? - perguntou Grace. Natalie e
Lila sentaram e eu hesitei.
O sorriso da Grace sumiu quando ela me viu. Ela era o
principal motivo por eu não querer voltar ao refeitório. Éramos melhores amigas
antes do incidente e, acho, até depois. Ela me visitou todos os dias no hospital
e em casa durante o verão, mas, quando começou nosso terceiro ano e meu status
social entrou em queda livre, nossa amizade seguiu o mesmo caminho- em público.
Em particular, ela dizia me amar como irmã. Todas as outras pessoas na escola
me tratavam como se eu não existisse.
- A Natalie para o Nicholas Green. - Lila deu uma tapinha
no assento entre ela e Natalie. Tentando me esconder, me joguei na cadeira, deslizei
as pernas para frente e coloquei o caderno de desenho na ponta da mesa.
As outras garotas sussurraram entre si quando me viram. Uma
delas deu uma risadinha. Desde a época em que voltei à escola, eu nunca tive uma
chance social. Os boatos sobre minha ausência desde o último mês do meu segundo
ano variavam de gravidez a reabilitação e tentativa de suicídio. Minhas luvas
se tornaram a lenha, e minha perda de memória, os fósforos. Quando retornei no
outono, os boatos explodiram em um incêndio incontrolável.
Lila continuou a explicação.
- A Demi vai ser monitora de um gato burro. Estamos
tentando descobrir quem é.
- Bom, não esconda nada, Lila. Quem é que a Demi vai
monitorar? - Os olhos da Grace se alternavam entre Lila e as garotas do seu time
sentadas a mesa. Quando voltamos para o terceiro ano, Grace descobriu que tinha
chances de se tornar chefe de torcida- algo difícil, já que ela nunca tinha
sido popular nesse grupo. Achei que as coisas entre a gente voltariam ao normal
quando ela fosse eleita. Eu estava errada.
- Pergunta pra Demi. - Os dentes da Lila morderam a maçã, o
olhar lixo na Grace. Nossa mesa ficou num silêncio esquisito enquanto a garota mais
bonita da escola desafiava abertamente a garota mais popular da escola. Uma
calmaria caiu sobre o refeitório enquanto os alunos se preparavam para assistir
ao espetáculo que estava para acontecer. Eu poderia jurar que uma folha tinha
passado voando pela mesa e que aquela música assobiada esquisita do faroeste
tinha tocado nos alto- falantes.
Dei um chute na Lila, implorando mentalmente que ela
respondesse por mim, em vez de forçar Grace a falar comigo na frente de outras pessoas.
Segundos se passaram e nenhuma das duas piscou enquanto se encaravam.
Não aguentei.
- Não sei. Vou conhecer o cara hoje à tarde. - A Sra.
Collins não quis me dizer de quem eu seria monitora. Ela falou alguma coisa
sobre acertar alguns detalhes com ele antes de nos conhecermos.
O movimento e a conversa retornaram ao refeitório. Os
músculos do rosto da Grace relaxaram e ela soltou um suspiro aliviado antes de assimilar
a reação das suas amigas públicas.
- Vou brincar de adivinhar quem é o gostoso idiota. - Ela
me deu uma piscadela em particular. Pela bilionésima vez, desejei que minha
vida voltasse ao normal.
Quando Grace soltou um nome, o resto do grupo também
decidiu brincar. Fiz um desenho dela enquanto conversavam. O novo corte de cabelo
curta e loiro emoldurava com perfeição seu rosto. Ouvi os nomes que elas
soltavam e as novas fofocas da escola que acompanhavam os palpites.
- Talvez a Demi seja monitora do Luke Manning - disse Lila
com uma cutucada não tão suave no meu braço. - Ele é gostoso e nada inteligente.
Revirei os olhos e fiz o melhor que pude para consertar a
linha escura que a cutucada tinha criado no meu desenho. Lila mantinha a falsa esperança
de que Luke, meu namorado da minha vida anterior, ainda gostasse de mim. Ela
apoiava essa afirmação com histórias inventadas de como ele me observava quando
eu não estava prestando atenção.
- O Luke e a Deanna terminaram nas férias de inverno –
disse Grace.
- A Deanna diz que ela terminou com ele. O Luke diz que ele
terminou com ela. Sabe- se lá se um dia vamos descobrir a verdade.
- Em quem você acredita, Demi? - perguntou Natalie. Tenho
de reconhecer.
Ela queria que eu participasse da conversa, mesmo que eu
não quisesse ser incluída.
Eu me concentrei em fazer a sombra que o cabelo da Grace
criava sobre a orelha. Depois de conhecer o Luke na aula de inglês do primeiro ano,
namoramos durante um ano e meio. Isso me tornava a especialista em Luke da
nossa mesa. Desde que a gente terminou todas as mesas com mulheres tinham uma
especialista em Luke.
- Difícil dizer. Fui eu que terminei com o Luke e ele nunca
falou que tinha sido ele, mas ele mudou muito desde aquela época.
- Joe Jonas - disse Natalie.
Parei de desenhar, confusa como que o Joe tinha a ver como
Luke.
- O que?
- Estamos tentando adivinhar o gostosão, lembra? Joe Jonas
é definitivamente gato. Eu seria monitora dele. - Lila encarou a mesa dos viciados,
quase babando. Como ela podia ficar em êxtase pelo cara que tinha me
ridicularizado?
O queixo da Grace caiu.
- E arriscar a posição social? De jeito nenhum.
- Eu disse que seria monitora dele, não que levaria o cara
pro baile de formatura. Além do mais, pelo que ouvi dizer, muitas meninas passaram
por ali e adoraram cada segundo.
Grace deu uma olhada no Joe, com os olhos subindo e
descendo.
- Tem razão. Ele é gato, e dizem que ele só topa ficar por
uma noite. Embora Bella Monahan tenha tentado forçar um relacionamento. Ela
seguiu o cara como um cachorrinho idiota. Ele não queria nada com ela que não
envolvesse o banco de trás do carro dele.
Lila adorava essa conversa suja.
- Ela perdeu o namorado, a virgindade, a reputação e o
respeito próprio em menos de um mês. Foi por isso que ela mudou de escola.
Caras como Joe Jonas me tiravam do sério. Ele usava as meninas,
consumia drogas e tinha me arrasado hoje de manhã. Não que eu devesse ficar
surpresa, fiz algumas aulas com ele no último semestre.
Ele entrava na sala a passos largos, como se fosse dono do
mundo, e dava um sorrisinho quando as garotas se derretiam na presença dele.
- Que imbecil.
Como se tivesse me ouvido do outro lado da sala, os olhos
negros dele encontraram os meus. O cabelo castanho despenteado caía sobre eles,
mas eu sabia que ele estava me olhando. A barba rata se moveu quando ele
sorriu. Joe tinha músculos, boa aparência e confusão à volta. De alguma forma,
ele fazia uma calça jeans e uma camiseta parecerem perigosas. Não que eu
gostasse de drogados que usavam garotas. Ainda assim, dei mais uma olhada para
ele enquanto dava um gole na minha bebida.
- Que palavras duras, Demi. Não esta falando de mim, esta?
– Uma cadeira arranhou o chão. Luke a virou para poder sentar de pernas abertas
entre Natalie e Grace. Que porcaria. Luke e eu mal trocamos uma palavra desde
que terminamos no segundo ano. Por que todo mundo estava me pressionando para
ficar social hoje?
- Não. - respondeu Lila. - Falamos de você mais cedo. A Demi
estava chamando o Joe Jonas de imbecil. - Chutei a perna dela por baixo da
mesa. Ela me encarou de volta.
- Jonas? – Luke Manning: um metro e noventa de altura,
forte como um touro, cabelos negros, olhos azuis, capitão do time de basquete, gato
e metido. Para meu desespero, ele avaliou o Joe. - O que o viciadinho fez pra
merecer sua raiva?
- Nada. - Voltei para o caderno de desenho. Minhas
bochechas queimaram quando uma das amigas públicas da Grace resmungou alguma
coisa sobre eu ser estranha. Por que Lila, Natalie e Luke não podiam
simplesmente me deixar em paz? As fofocas só pioravam quando eu saía da minha
concha.
Infelizmente, Lila preferiu ignorar minhas bochechas vermelhas
e meu chute de alerta.
- Ele tirou sarro da Demi hoje de manhã, mas não se
preocupe, ela acabou com ele.
O lápis na minha mão se curvou com meu aperto, enquanto eu sentia
vontade de arrancar os lindos cabelos da Lila. Meus professores e a Sra. Collins
estavam muito errados. Interagir com meus colegas era uma droga.
Os olhos do Luke se estreitaram.
- O que ele disse pra você?
Pisei nos dedos do pé da Lila e a encarei.
- Nada.
- Ele disse que ela tinha um nome ridículo.- respondeu
Lila.
Ah, meu Deus, eu queria matar minha melhor amiga.
- Quer que eu fale com ele? - Luke me encarava com um
conhecido indício de possessividade. Grace e Natalie sorriram como o gato de
Alice.
Eu me recusei a olhar para Lila, que quicava na cadeira.
Agora eu nunca mais me livraria das fantasias dela sobre o Luke e eu voltarmos
a namorar.
- Não. Ele é um cara idiota que disse uma coisa idiota. Ele
provavelmente nem lembra de ter falado isso.
Luke deu uma risadinha.
- É verdade. Todo mundo naquela mesa ali é ferrado. Sabia
que o Jonas mora num lar adotivo?
As garotas na minha mesa engasgaram com a nova fofoca.
Olhei para o Joe outra vez. Ele parecia muito envolvido numa conversa com uma
garota de cabelo preto comprido.
- É - continuou Luke. - Ouvi a Sra. Rogers e o Sr. Norris falando
isso no corredor. - O sinal tocou, acabando com a atenção que Luke recebia pelas
informações secretas sobre Joe Jonas.
Enquanto eu jogava fora os restos do meu almoço, Grace se
infiltrou perto de mim e sussurrou:
- Isso foi demais, Demi. Se o Luke estiver apaixonado por
você de novo, sua vida vai mudar. Todo mundo muda de opinião sobre as pessoas que
ele namora. Talvez as coisas finalmente voltem ao normal.
Uma das amigas da Grace a chamou, e ela saiu do meu lado
sem piscar.
Suspirei enquanto puxava as mangas sobre os dedos. O que eu
não daria para ser normal...
XOXO Neia :)
Desculpem a demora. As minhas aulas estão prestes a começar e ando a comprar as coisas necessárias e tudo mais. Muito stress rsrsrs.
Está ai o cap. comentem e espero que gostem :)
Kisses <3